sábado, 19 de maio de 2012


O professor e os āsanas, perigo escondido!



Depois de conversar com uma pessoa amiga que já não via há muito tempo, dei por mim a refletir sobre algumas ideias, algumas presentes neste pequeno texto.

Essa pessoa magoou-se durante uma aula de Yoga, e isso já eu sabia. Decidi inquirir e descobrir mais a fundo como tinha acontecido a lesão.

Para salvaguardar e respeitar as pessoas envolvidas, ou seja professor e aluno (não quer dizer que sejam do género masculino), não direi nomes, nem revelarei a postura em que a pessoa se magoou.  

O aluno/a sentiu dor na postura, uma dor desconfortável, como todas as dores são. A dor era na articulação, pior ainda. Mas como de mal se pode ir para pior, foi o que aconteceu, a permanência naquela situação de desconforto e perigosa para a articulação deu origem a algo lamentável.

Sabem qual foi o resultado? O resultado foi uma lesão que não curava mesmo depois de semanas! Assim sendo, foi necessário perceber o que se passava com a articulação, ou melhor, para dizer a verdade, o que se passava com as articulações.

Exames feitos, relatórios entregues, o somatório final de duas lesões. Foi necessário fisioterapia, aliás ainda está a ser, para que a recuperação, que espero que possa ser total possa vir a acontecer.

Ao que parece, o aluno/aluna foi falar com o professor/a e contou-lhe o sucedido. O professor/a respondeu que fez tudo bem e que voltava a fazer tudo de novo. Ainda disse que se calhar existem alunos com lesões latentes e que o Yoga pode despoletar essas lesões escondidas. Como não podia deixar de ser, aqui começou a reflexão.

O Yoga visa regenerar e não degenerar!

Se o professor/a fez tudo bem e o/a aluno/a se lesionou, alguma coisa correu muito mal.

A função do professor é zelar sempre pela saúde do aluno. Se a prática de āsanas tem, entre outras funções importantes, a de aumentar a vitalidade, aumentar a saúde, movimentar o prāṇa, etc., ora tudo correu mal!
O aluno perdeu saúde articular e por consequência vitalidade! E claro, se existe dor, seja ela qual for, diz a tradição que é uma estagnação do prāṇa, ou seja não estava a haver movimentação do prāṇa. Será isto Yoga? NÃO!

A função do professor é a de alertar para os perigos quando eles existem, e verificar se o aluno está apto para determinada técnica. Deverá convidar o aluno ser verdadeiro com ele mesmo e a desfazer a postura se houver desconforto.

“Sthirasukhamāsanam”, Yoga sutras, sutra 46, cap II Sādhana Pāda   

Sthiram significa estável, firme, quieto. Sukham significa confortável.

O āsana deverá ser firme e confortável. Foi o caso? Não. É o aluno que deverá saber isso? Não! É a função do professor, direi mesmo mais, é o dever do professor perceber se o aluno está confortável e agir para o por confortável e em segurança.  

Na Bhagavadgītā, também conhecida por Vedasāra, a condensação dos Vedas, ou a essência do Veda, encontramos outra definição de Yoga

“…Dhanañjaya…samatva yoga ucyate”, “Ó Dhanañjaya…a atitude de equilíbrio é chamada de Yoga”. V. 48 Cap. II


Muitas vezes o aluno esconde o desconforto por ter vergonha, por poder estar a ser levado pelo ego, enfim são muitas as razões…Bom é o professor que se apercebe disso e o trás para samatva, para um estado de equilíbrio, um estado de equanimidade.

O que será esse estado? No que diz respeito à prática de āsana, e mais especificamente a este caso particular, será refazer a postura para que a equanimidade seja possível. A postura deverá ser sem dor articular. A postura deverá permitir uma respiração completa e total. A postura deverá ser de tal forma confortável que seja possível ao praticante observar e dirigir o movimento o prāṇa.

Sentir uma dor aguda e perigosa bem no centro da articulação e fingir de conta que não é nada, não pode nunca ser chamado de equanimidade, pode sim ser chamado de hisa, violência, e mais não direi para não perder a objectividade.

Suponham agora este exemplo. O aluno por acaso era um atleta de competição federado. Um atleta que procurava no Yoga aumentar a sua tranquilidade e calma. Situação muito comum hoje em dia. O professor corre o sério risco de poder ser culpado pelo sucedido. O resto do desenvolvimento podem imaginar.

Será um professor bom por conseguir por os alunos a fazer “āsanas avançados”?

Será um professor bom por exigir aos alunos aquilo que eles não podem dar?

Será um professor bom aquele que ajusta os alunos?

Professor bom é aquele que nunca esquece a segurança dos alunos!
Aluno bom é aquele que usa a sua inteligência em prol da sua segurança!

Professor bom é aquele que reconhece as diferentes necessidades dos diferentes alunos e age em função disso!
Aluno bom é aquele que reconhece e aceita as suas limitações!

Professor bom é aquele que fica contente quando os alunos usam a liberdade a que têm direito, para não fazer o que o professor sugere, se isso for demais para ele!
Aluno bom reivindica os seus direitos, nomeadamente liberdade para não fazer, e claro o importante e mundial direito à saúde!

Professor bom é aquele que convida o aluno a não se lesionar!
Aluno bom é aquele que não se deixa lesionar pelo professor!


Professor bom tem compaixão e claro, tem sabedoria!
Aluno bom tem compaixão e claro, tem sabedoria!

Professor bom é aquele que está atento a cada instante, sempre conscientemente presente na acção de ensinar!
Aluno bom é aquele que está atento a cada instante, sempre conscientemente presente na acção de aprender!


Podia estender-me mais mas penso que foi suficiente.

Serve o presente texto para ajudar professores e alunos para que a atitude seja sempre a mais harmoniosa e saudável dentro da prática. Afinal de contas o Yoga é algo de muito auspicioso, possa ele abençoar ambos, professor e aluno!

Paulo Vieira


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