O professor e os āsanas, perigo escondido!
Depois de conversar com uma
pessoa amiga que já não via há muito tempo, dei por mim a refletir sobre
algumas ideias, algumas presentes neste pequeno texto.
Essa pessoa magoou-se
durante uma aula de Yoga, e isso já eu sabia. Decidi inquirir e descobrir mais
a fundo como tinha acontecido a lesão.
Para salvaguardar e
respeitar as pessoas envolvidas, ou seja professor e aluno (não quer dizer que
sejam do género masculino), não direi nomes, nem revelarei a postura em que a
pessoa se magoou.
O aluno/a sentiu dor na
postura, uma dor desconfortável, como todas as dores são. A dor era na
articulação, pior ainda. Mas como de mal se pode ir para pior, foi o que
aconteceu, a permanência naquela situação de desconforto e perigosa para a
articulação deu origem a algo lamentável.
Sabem qual foi o resultado?
O resultado foi uma lesão que não curava mesmo depois de semanas! Assim sendo,
foi necessário perceber o que se passava com a articulação, ou melhor, para
dizer a verdade, o que se passava com as articulações.
Exames feitos, relatórios
entregues, o somatório final de duas lesões. Foi necessário fisioterapia, aliás
ainda está a ser, para que a recuperação, que espero que possa ser total possa
vir a acontecer.
Ao que parece, o
aluno/aluna foi falar com o professor/a e contou-lhe o sucedido. O professor/a
respondeu que fez tudo bem e que voltava a fazer tudo de novo. Ainda disse que
se calhar existem alunos com lesões latentes e que o Yoga pode despoletar essas
lesões escondidas. Como não podia deixar de ser, aqui começou a reflexão.
O Yoga visa regenerar e não
degenerar!
Se o professor/a fez tudo
bem e o/a aluno/a se lesionou, alguma coisa correu muito mal.
A função do professor é
zelar sempre pela saúde do aluno. Se a prática de āsanas tem, entre outras funções importantes, a de
aumentar a vitalidade, aumentar a saúde, movimentar o prāṇa, etc., ora tudo correu mal!
O aluno perdeu saúde
articular e por consequência vitalidade! E claro, se existe dor, seja ela qual
for, diz a tradição que é uma estagnação do prāṇa, ou seja não estava a haver movimentação do prāṇa. Será isto Yoga? NÃO!
A função do professor é a
de alertar para os perigos quando eles existem, e verificar se o aluno está
apto para determinada técnica. Deverá convidar o aluno ser verdadeiro com ele
mesmo e a desfazer a postura se houver desconforto.
“Sthirasukhamāsanam”, Yoga sutras, sutra 46, cap
II Sādhana Pāda
Sthiram significa estável,
firme, quieto. Sukham significa confortável.
O āsana deverá ser firme e confortável. Foi o caso? Não.
É o aluno que deverá saber isso? Não! É a função do professor, direi mesmo
mais, é o dever do professor perceber se o aluno está confortável e agir para o
por confortável e em segurança.
Na Bhagavadgītā, também conhecida por Vedasāra, a condensação dos Vedas,
ou a essência do Veda, encontramos outra definição de Yoga
“…Dhanañjaya…samatvaṁ yoga ucyate”, “Ó Dhanañjaya…a
atitude de equilíbrio é chamada de Yoga”. V. 48 Cap. II
Muitas vezes o aluno
esconde o desconforto por ter vergonha, por poder estar a ser levado pelo ego,
enfim são muitas as razões…Bom é o professor que se apercebe disso e o trás
para samatvaṁ, para um estado
de equilíbrio, um estado de equanimidade.
O que será esse estado? No
que diz respeito à prática de āsana,
e mais especificamente a este caso particular, será refazer a postura
para que a equanimidade seja possível. A postura deverá ser sem dor articular. A
postura deverá permitir uma respiração completa e total. A postura deverá ser
de tal forma confortável que seja possível ao praticante observar e dirigir o
movimento o prāṇa.
Sentir uma dor aguda e
perigosa bem no centro da articulação e fingir de conta que não é nada, não
pode nunca ser chamado de equanimidade, pode sim ser chamado de hiṁsa, violência, e mais não direi
para não perder a objectividade.
Suponham agora este exemplo.
O aluno por acaso era um atleta de competição federado. Um atleta que procurava
no Yoga aumentar a sua tranquilidade e calma. Situação muito comum hoje em dia.
O professor corre o sério risco de poder ser culpado pelo sucedido. O resto do
desenvolvimento podem imaginar.
Será um professor bom por
conseguir por os alunos a fazer “āsanas
avançados”?
Será um professor bom por
exigir aos alunos aquilo que eles não podem dar?
Será um professor bom
aquele que ajusta os alunos?
Professor bom é aquele que
nunca esquece a segurança dos alunos!
Aluno bom é aquele que usa
a sua inteligência em prol da sua segurança!
Professor bom é aquele que
reconhece as diferentes necessidades dos diferentes alunos e age em função
disso!
Aluno bom é aquele que
reconhece e aceita as suas limitações!
Professor bom é aquele que
fica contente quando os alunos usam a liberdade a que têm direito, para não
fazer o que o professor sugere, se isso for demais para ele!
Aluno bom reivindica os
seus direitos, nomeadamente liberdade para não fazer, e claro o importante e
mundial direito à saúde!
Professor bom é aquele que
convida o aluno a não se lesionar!
Aluno bom é aquele que não
se deixa lesionar pelo professor!
Professor bom tem compaixão
e claro, tem sabedoria!
Aluno bom tem compaixão e
claro, tem sabedoria!
Professor bom é aquele que
está atento a cada instante, sempre conscientemente presente na acção de
ensinar!
Aluno bom é aquele que está
atento a cada instante, sempre conscientemente presente na acção de aprender!
Podia estender-me mais mas
penso que foi suficiente.
Serve o presente texto para
ajudar professores e alunos para que a atitude seja sempre a mais harmoniosa e
saudável dentro da prática. Afinal de contas o Yoga é algo de muito auspicioso,
possa ele abençoar ambos, professor e aluno!
Paulo Vieira
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