domingo, 12 de dezembro de 2010

MUDAR PORQUÊ?


                       


Mudar porquê?

Todos nós, numa ou em várias alturas da vida chegamos à conclusão de que há algo que não está bem. Os sentimentos de insatisfação, frustração e até tristeza são o alerta e fazem-nos parar para pensar e reflectir. Questionamo-nos sobre a causa desses sentimentos desconfortáveis, e muitas vezes chegamos à conclusão que a causa é exterior. Já não me sinto bem nesta casa, já estou farto deste emprego, o dinheiro que ganho é pouco, a relação com a minha mulher é auto-destrutiva, sinto-me cansado e ansioso, quero mudar de vida, o Inverno deprime-me, etc… A lista poderia continuar….
Em todos estes exemplos o elemento comum é o indivíduo, por isso, o problema não está na casa, nem no emprego nem na mulher, o problema está na pessoa, na relação que ela estabelece com o mundo. O problema está na expectativa que o indivíduo impõe, exige às pessoas, objectos e situações.
Se tenho o desejo de comer um pouco de chocolate, surge a expectativa de obter algum prazer sensorial da experiência comer chocolate. Sei que vou apreciar essa experiência, imponho e exijo ao chocolate que me satisfaça. E será que ele satisfaz mesmo? Será que o prazer está no chocolate? No primeiro pedaço a satisfação é enorme e aumenta no segundo e terceiros pedaços. Ao quinto talvez comece a hesitar e sem dúvida que fico enjoado no final da tablete de 250gr. O chocolate satisfez muito, depois satisfez pouco e no final enjoou-me. O mesmo chocolate que adorei e muito quis para mim, agora é simplesmente evitado. Onde está o problema afinal? Será em mim? Ou na relação que tenho com o chocolate? No chocolate definitivamente não está, em mim sim, agora tenho um problema, estou enjoado! O problema está na relação que estabeleço com o chocolate e na exigência que é imposta a esta relação eu/chocolate. Chocolate é o exemplo, poderia ser a casa, o carro, a esposa ou o emprego…
O desconforto que é sentido é directamente proporcional à grandeza da exigência frustrada que foi imposta na relação.
Quanto mais eu quero algo, mais sofrerei, mais frustrado ficarei se não obtiver esse algo. Se eu quiser mesmo esse algo, uma coisa é certa, é muito mais fácil obtê-lo com calma e discernimento. Se estou farto do meu patrão pois ele é um imbecil e por isso quero mudar de emprego, a calma irá dar-me mais do que o nervosismo, irá dar-me a estabilidade suficiente para escolher um plano de acção que resolva a situação e irá dar-me a capacidade de descobrir a melhor altura para concretizar esse plano.
Se abdico da exigência, fico livre, liberto-me da minha exigência, e isto é algo simplesmente maravilhoso e transformador. Neste processo reconheço-me como alguém capaz de aceitar as coisas como são e reconheço todo o potencial que tenho para abandonar a necessidade de controlo. A necessidade de controlo surge na mente, ela tem uma causa, talvez seja o medo da perda que origina um sentimento de insegurança e uma necessidade extrema de afirmação, talvez seja raiva oprimida, talvez seja algo inconsciente. Se assim é, agora sei que existe algo que desconheço que precisa da minha atenção. Reconheço que há um factor desconhecido que condiciona o meu pensamento, as minhas emoções e por isso o meu comportamento.
Não há nada de errado em querer mudar. Se analisarmos com objectividade todo o percurso das nossas vidas, vemos que ele foi sempre pautado pela mudança. Viver é assistir e essa imutável mudança, assistir a esta infinita dança cósmica de galáxias, estrelas, planetas e seres vivos. Podemos mudar aquilo que achamos que não está bem, mas acima de tudo aquilo que não está bem em nós. Como diz Gandhi: “ Sê tu próprio a mudança que queres ver no mundo”. Sabemos que o problema esta na relação que temos com o mundo, então também sabemos que o problema esta na relação que temos com o nosso mundo interior, na relação eu/eu. Aqui é que a verdadeira mudança acontece, é aqui que o verdadeiro potencial da mudança nasce. A mudança de atitude perante nós próprios é expandida para o exterior, para pessoas, factos, objectos e situações. Se me liberto das exigências que tenho para comigo, aceito-me como um ser humano não exigente. Dou aos desejos e ambições o lugar relativo que eles merecem, eles passam a ser motivadores e não limitadores. Um desejo motiva-me no sentido da acção para o realizar, por isso se quero mudar de emprego, que isso seja uma motivação para procurar algo melhor, algo que me convém mais, que vai mais ao encontro das minhas ambições. Se pelo contrário, esse desejo de mudança gera demasiada insatisfação, então sentir-me-ei condicionado, limitado por esse mesmo sentimento que se tornará inoportuno, desconfortável e contraproducente.
A mudança de atitude pressupõe uma mudança de valores. Se valorizo a tranquilidade e a harmonia mental e social, então a minha atitude será naturalmente a da procura da tranquilidade e harmonia. Se o que valorizo é o meu bem-estar então a minha atitude conduzir-me-á a esse bem-estar. Se o que valorizo é a ausência de violência, naturalmente a grande parte das minhas acções serão geradoras de paz. Se valorizo o companheirismo e a amizade, serei um bom companheiro e amigo. Se já não valorizo a necessidade de controlar o mundo, a atitude será a de aceitação, Kshanti. Tudo aquilo a que dou valor torna-se importante para mim. Quando valorizo os meus valores eles tornam-se importantes, transformam-se em atitudes congruentes com as minhas ambições e enriquecem-me como pessoa, tornando-me num ser humano mais maduro.
Das pequenas mudanças e das pequenas coisas surgem os grandes ganhos, a mudança de um grau numa trajectória com milhares de quilómetros é muito significativa, é uma mudança de milhares de quilómetros.

Texto escrito por Paulo Vieira

Sem comentários:

Enviar um comentário